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Foto do escritorFernanda Carpegiani

LIXÕES | Ainda teremos lixões em 2024?

Nova lei estendeu prazo para erradicação dos lixões para 2024. Por falta de financiamento, regulação e fiscalização, este crime ambiental, originalmente previsto para acabar em 2014, continua impune e sem perspectivas concretas de extinção.

Um enorme desrespeito ambiental e social. É assim que podemos resumir a realidade dos lixões no Brasil. Temos entre 1,6 mil e 3 mil desses amontoados de resíduos a céu aberto, segundo levantamentos feitos por associações de empresas que atuam na gestão de resíduos. O grande problema é que o lixão costuma receber um misturado de materiais recicláveis, orgânicos e rejeitos. Tudo sem tratamento, planejamento ou medida de proteção ao meio ambiente e à saúde pública.


De um lado, esses espaços podem emitir cerca de 6 milhões de toneladas de gás de efeito estufa por ano. É o que aponta um levantamento do Departamento de Economia do Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb). Isso sem falar na poluição do solo e dos lençóis freáticos.


De outro lado, está a situação de extrema vulnerabilidade das pessoas que circulam pelos lixões, seja em busca de materiais recicláveis ou de alimentos. Afinal, onde tem lixão, tem catador. Por esse motivo, uma das metas que ganhou destaque na Política Nacional de Resíduos Sólidos foi justamente a de erradicar os lixões no Brasil até 2021. O prazo não foi cumprido, ao contrário: a Lei nº 14.026, assinada em 2020, o estendeu até 2024. Será que agora vamos conseguir?



Há ainda um longo caminho a percorrer, mas temos avanços


Para a engenheira civil e sanitarista Heliana Kátia Campos, as chances de cumprir a nova meta são mínimas. O Brasil ainda não aprovou seu Plano Nacional de Resíduos Sólidos, passo fundamental para garantir políticas efetivas de apoio e direcionamento de ações nesse sentido. "Não há interesse sério por parte do governo para ajudar os municípios", diz a especialista, que é coordenadora da Câmara Temática de Resíduos Sólidos da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES). "Os programas que existem são pífios. Tem que ter recursos financeiros, metas e condições para realizar."


Além de concordar, a geógrafa Claudia Lins, supervisora do Núcleo de Desenvolvimento Territorial da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), reitera que as esferas estadual e federal precisam assumir sua parcela de responsabilidade pela gestão de resíduos sólidos. "A prorrogação do prazo para erradicação dos lixões é vazia, porque foi vetado o apoio técnico e financeiro da União e dos estados para os municípios. Se esse abandono continuar, só teremos avanços pontuais."


Sim, os avanços existem e precisam ser apontados. "O número de lixões tem caído nos últimos anos, ainda que pouco. Já a quantidade de resíduos lançados em lixões tem diminuído de forma muito significativa", diz Kátia Campos. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) de 2019, 75% dos resíduos sólidos do país já estão indo para aterros sanitários. Além disso, a única capital brasileira que ainda tem lixão é Cuiabá (MT).


Desafios para a destinação de resíduos


O que impede uma evolução maior e mais ágil é a falta de recursos técnicos e financeiros. Principalmente em municípios pequenos. Quando dirigiu o Serviço de Limpeza Urbana do Distrito Federal, Kátia coordenou o fechamento do segundo maior lixão do mundo. Ela conta que foram necessários R$ 27 milhões para fazer o aterro sanitário de Brasília. Ao mesmo tempo, o custo anual de manutenção da estrutura é de R$ 25 milhões. "Visitei pequenos aterros em cidades de até 5 mil habitantes e encontrei todos fechados. Ninguém consegue operar, porque o custo é muito alto."



Em auditoria realizada em 2012, o Tribunal de Contas da União (TCU) mostrou que não houve sucesso em 65% dos projetos financiados pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para destinação adequada de resíduos em pequenas cidades. Foram avaliados 231 convênios firmados entre 2000 e 2007 com municípios de até 50 mil habitantes. Ao cruzar os dados com a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico do IBGE, o TCU descobriu que em 152 casos os resíduos continuaram indo para lixões ou aterros controlados, que também estão fora dos padrões ambientais.


Encontrar áreas que atendam às normas ambientais para fazer aterros é outro grande desafio. Foi assim que o consórcio do Seridó (RN) quase perdeu o prazo para executar o recurso da Funasa. "São mais de dez municípios e apenas um tinha área viável para a implantação. Era um terreno privado e a prefeitura pediu desapropriação pelo bem coletivo. Mas o dono seguiu recorrendo por anos na justiça", conta Claudia Lins.


Ainda assim, a regionalização é a solução mais indicada por especialistas em gestão de resíduos. Há casos como o de Minas do Leão (RS), em que mais de 100 municípios utilizam um único aterro sanitário. Segundo a especialista da CNM, essa é uma forma de minimizar custos e maximizar benefícios. Ao mesmo tempo, não há resposta única ou universal. "Cada local tem seus desafios e especificidades territoriais, e isso precisa ser observado", afirma.


Regionalização e compostagem estão entre as soluções


Criar consórcios é a solução mais indicada por especialistas em gestão de

resíduos. Em Minas do Leão (RS), por exemplo, mais de 100 municípios consorciados utilizam um único aterro sanitário. Segundo Claudia Lins, essa é uma forma de minimizar custos e maximizar benefícios. Ao mesmo tempo, não há resposta única ou universal, porque cada local tem seus desafios e especificidades territoriais.


Outro passo importante é diminuir a destinação incorreta de resíduos para aterros sanitários. Para isso, a indústria da reciclagem e a logística reversa precisam avançar mais. "O que determina se um material é reciclável ou não é a viabilidade técnica, econômica e financeira desse processo. Em Brasília, por exemplo, o vidro não é reciclável", explica Katia Campos.


Nesse sentido, também é necessário retomar e estimular a compostagem, que pouco avançou nos últimos dez anos. O número de municípios que composta foi de 68 em 2010 para 73 em 2019, segundo dados do SNIS. Isso não só prejudica o tratamento dos resíduos e favorece a contaminação, tanto nos lixões quanto nos aterros, como também é ruim do ponto de vista financeiro e logístico.

“Resíduo orgânico é basicamente água. No caso dos consórcios, um município precisa fazer o transporte dos seus resíduos para outro município. Então, o município paga para transportar água até o aterro sanitário, e a contaminação encarece ainda mais o tratamento dos resíduos", afirma Katia Campos, que cita como bom exemplo a coleta seletiva de lixo orgânico de Florianópolis (SC).



Conheça outros exemplos de boas práticas


A CNM reúne informações sobre boas práticas de gestão de resíduos em municípios brasileiros. Alguns projetos de destaque:


Aterro Sanitário Intermunicipal Nascentes do Pantanal (MT)


Dois Irmãos (RS)


Jaboatão dos Guararapes (PE)


 

Coordenação editorial e edição: Sérgio Rizzo.



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